Entrevistas

Monge Marcelo Barros Assessor da oficina Profetas de Ontem e de Hoje.

     O jornal A Estação em Itabuna entrevistou o monge Marcelo Barros, que falou sobre os profetas e profetizas de ontem e de hoje, homenageando o padre Comblin.

     A gente está passando por uma série de mudanças políticas na América Latina, desde golpe, ditadura, esquerdas que passam a se alinhar à direita, a entrada da América Latina ou a tentativa de entrada da América Latina nessa rota desenvolvimentista e aí vem essa temática Justiça e Profecia a serviço da vida no Nordeste e o senhor vem falar profetas e profetisas de ontem e de hoje, então diante dessa conjuntura de América Latina quem são os profetas e profetisas de hoje, onde é que eles estão, o que eles estão fazendo, como é que eles atuam?
 
    Marcelo Barros – Eu acredito que na América Latina e no Caribe, a profecia hoje tem que vir através da justiça social, e justiça social e política, numa mudança das estruturas, e quem fez isto primeiro foi Cuba, é claro que eu não vou dizer pra você que profeta é Fidel Castro porque ele não fez isto sozinho e nem de cima pra baixo, é todo um povo, é toda uma comunidade, movimentos dando a vida. Quantas pessoas deram a vida na Revolução Cubana? Mas conseguiram fazer um país. Quando a gente chega no aeroporto a primeira coisa que a gente vê numa grande placa que tem na estrada diz assim: BEM VINDO AO PRIMEIRO TERRITÓRIO LIVRE DAS AMÉRICAS. Cuba há 53 anos que enfrenta uma guerra como se fosse uma formiga e um elefante. Cuba é deste tamaninho (gesto com a mão), pobre, pequena, e não é vencida pelo império norte americano, o maior império que já houve na história, mais poderoso, mais armado, porque tem armas atômicas, maior do que o próprio Império Romano antigamente. Depois de Cuba nós tivemos a Nicarágua Sandinista, que se libertou da ditadura do Somoza e fez uma vida um país realmente a partir dos pequenos, também muita guerra dos EUA, nem pode levar pra frente muitos projetos, mas alguma coisa ficou. Nos anos 90 a Venezuela e a partir do começo deste século em 2002, Hugo Chaves, e todo um caminho que se chama bolivariano porque vem de Simon Bolívar, o grande libertador da América no começo do século XIX, 1807-1808. Então, nós temos hoje realmente pessoas, mas eu não queria ficar destacando presidentes como Hugo Chaves na Venezuela, Evo Morales na Bolívia, Rafael Correa no Equador, porque eu queria destacar as comunidades indígenas, as comunidades negras, os grupos, as comunidades de CEB’s, grupos de base que estão numa perspectiva muito boa, muito bonita pra transformar o mundo.

      Qual a responsabilidade das CEB’s nessa iniciativa profética de denunciar e anunciar? A gente vê uma onda denuncista de algum movimento, mas e o anúncio? Qual a responsabilidade das CEBs no anúncio, do anúncio do Reino?

     Marcelo Barros – Eu acredito que as CEB’s surgiram a partir da Conferência Episcopal da América Latina (CELAM), em Medelín na Colômbia em 1968 como um gesto e um caminho profético justamente para apoiar os movimentos libertadores, a Teologia da Libertação que tava surgindo naquela época contra as ditaduras, e nesse sentido foi muito profético naquele tempo. Hoje, a gente não tem mais essas ditaduras militares do jeito de antigamente, embora no Paraguai tenha havido um Golpe de Estado feito pelo próprio Congresso e em Honduras um Golpe de Estado feito pelos militares, mas em geral, as ditaduras hoje têm outra cara, a cara econômica, é a Ditadura do Neoliberalismo, e as têm que ser proféticas em lutar contra isso e anunciar esse caminho novo. No lugar da ALCA, a ALBA; no lugar de Tratados com os EUA, olhar pra frente e não querer um desenvolvimentismo que polui a natureza, que cria mais desigualdades, que destrói a humanidade. Procurar um desenvolvimento sim, porque isto teria que ter todo o mundo, mas a partir da justiça, da igualdade, da ecologia e da paz.

      Hundira – E o ecumenismo?

    Marcelo Barros – Isto não se faz sem ecumenismo, o ecumenismo, este Projeto de Deus da unidade de todos os seres humanos, em todas as religiões e todas as culturas, faz parte essencial da vocação das CEB’s.

        Qual a expectativa do senhor pra 6º Nordestão?

     Marcelo Barros – O Nordestão é um encontro que está preparando para o 13º Encontro Intereclesial das CEB’s, portanto o encontro do Brasil inteiro, e nesse sentido, a perspectiva melhor é que esse processo se faça nas bases, que o pessoal volte animado, porque hoje em dia no Brasil, a muitas vezes a gente pensa assim: as CEB’s é muito bonita, o estilo muito bom, nós estamos muito de acordo, mas parece que já passou, parece que hoje me dia, o que tem vez na igreja são os movimentos carismáticos, são os movimentos espiritualistas, as missas show do padre esse, do padre aquele, e as CEB’s não têm vez. Então quando a gente vem pra cá, e vai acontecer isso, e encontra com 500 pessoas, dos mais diversos pontos do Nordeste e todos animados e todos estimulados por esta caminhada em comum, e aí não, a gente volta pra casa e diz: tava pensando que nós éramos tão pouquinhos, tão fracos, tão... né? E não somos, somos pequenos, somos pobres, mas estamos juntos, estamos lutando e vamos continuar resistindo.



Pastor Marcos Monteiro de Feira de Santana assessor da oficina Romeiros e Romeiras no Campo e na Cidade: desafios e perspectivas.

      Pastor Marcos logo no inicio das CEB’s nas músicas e nos poemas a gente sempre ouvia falar nas CEB’s como a igreja dos pequenos, a festa dos pequenos e o senhor vem tratar da temática Romeiros e Romeiras no Campo e na Cidade: desafios e perspectivas, então a gente sabe que remete a periferia remete a problemas no campo. Então, eu gostaria que o senhor fizesse uma relação desta temática Justiça e profecia a serviço do NE e os pequenos do NE. Quem são estes pequenos do NE, e porque discutir esta temática dentro do Nordestão?

    Marcos Monteiro – Primeiro Hundira, é meu privilégio estar participando das CEB’s, sempre fui fascinado pela CEB’s e no ano passado teve encontro mais de perto assessorando o encontro da CEB’s aqui em Itabuna e a gratidão que eu tenho de me permitir em participar deste instante é muito grande, é uma fascinação, é um privilégio, me ofereceram o tema Romeiros e romeiras no campo e na cidade eu acho paradoxo e um desafio porque um romeiro é sempre visto com desconfiança pela minha herança protestante, evangélica visto com um ingênuo, um supersticioso, um cristão de segunda categoria, alguém que vai manipulado por interesses outros ou aquele assim que não conhece realmente, que vai, que erra o caminho, e eu gosto desta ideia do errante, errar é a esperança, aquele que erra que sai errante, que sai caminhando, abre possibilidade de desconstrução do estabelecido, do fixado, do imóvel, o cristão movente, o cristão é aquele que se movimenta e novamente a sabedoria tem de ser entendida e encontrada fora das academias, fora dos palácios, fora das instituições, no cotidiano dos pequeninos. Encontrar os pequeninos é muito mais do que uma espécie de evangelização, uma espécie de buscar ajudá-los num empoderamento como a gente faz. Eu creio que pelo contrário, numa relação não ingênua, numa relação crítica, é encontrar conjuntamente as raízes de nós mesmos, é nos achar como humanos, como seres, e nesse sentido justiça, profecia e caminho estão muito juntos, porque caminhar é próprio dos ser humano, é próprio de humanos e humanas, a civilização da pressa, a civilização do automóvel, é um pouco que contrariada nesta perspectiva do caminhar, o ser humano é um ser que caminha, que coloca o corpo na direção do novo, do não estabelecido, na direção da errância.
     O senhor falou da sua tradição evangélica, e agente vê que por mais que se tente, estão esvaziados os espaços de tentativa de construção ecumênica. Como é que o senhor vê as CEB’s e a construção do ecumenismo?

      Marcos Monteiro- É interessante, há um ecumenismo, um movimento ecumênico institucional, em que como você mesmo disse as organizações enfrentam crises imensas. As grandes instituições ecumênicas, os grandes movimentos ecumênicos estão em crise, as igrejas também, as igrejas estão menos ecumênicas no sentido de que nessa voracidade de mercado elas disputam os fiéis como quem disputa a sua própria sobrevivência, como se tivessem se sentindo ameaçadas por uma falta de sentido e elas se dilaceram, as religiões hoje brigam mais do que antigamente, por outro lado, há na prática no convívio das pequenas pessoas, nos movimentos sociais uma convivência ecumênica que desafia as perspectivas dos grandes. Na nossa oficina, na nossa caminhada, encontrei um momento, inclusive eu tenho um texto sobre isto, uma figura extraordinária onde não esperava ter encontrado esses ecos de ecumenismo humano, simples dos pequeninos, figura da Dalvanira. Dalvanira, aquela mulher da Assembleia de Deus, então quando nós pensamos em Assembleia de Deus pensamos em uma Igreja onde existe resistência em contatos até mesmo entre evangélicos, imagine assim em contatos católicos ou até no macro ecumenismo - um respeito a formas novas, a formas mais amplas de significar o divino como o contato com outras religiões - há uma resistência, mas Dalvanira na sua simplicidade falava da luta, ela estava no meio de um acampamento sem terra, falava da luta do sem terra como uma prática ecumênica, todos os religiosos, todas as religiões, todo mundo participava, ela falava muito, Dalvanira, e era uma figura assim sorridente, uma figura amável, e eu fiquei curioso sobre esta mulher que falava de Deus o tempo todo e falava com Deus o tempo todo. Deus falava com ela, Deus é tudo pra ela não é desta figura que a gente conhece que advogam a presença constante de Deus. E comecei a conversar e perguntar a ela:  - Você já era assim antes? Você era de outra religião? Você era assim antes? Você já falava com Deus antes?Aí ela disse: - Eu era católica eu já falava com Deus, Deus já falava comigo do mesmo jeito e foi Deus que mandou sair daquela igreja.Eu disse: - E porque Deus mandou sair dessa igreja? E ela disse: - Eu estava lá na minha comunidade e dirigente da comunidade expulsou um rapaz que estava um santinho na comunidade, naquele momento Deus me falou saia deste lugar porque eu não estou neste lugar. (risos) Eu fique com uma vontade imensa de rir por dentro de mim porque as pessoas pensam que a migração religiosa acontece por questão de doutrina, por questão de conhecimento, de busca de acesso de satisfação e às vezes não é, às vezes é por uma percepção de injustiça nas pequenas relações. Ela com católica estava defendendo o pobre para vender os santinhos pra se tornar evangélica é uma contradição, mas é dessas contradições que o ecumenismo se alimenta fundamentalmente somos humanos, filhos do mesmo Deus caminhantes da vida, encantados com o chão e com Sol e neste encantamento, nessa junção, todos somos ecumênicos, habitantes da mesma terra caminhantes com o mesmo Deus com mesmo Jesus cristo, e novamente, são os pequeninos que nos arrastam a saber que o ecumenismo ´´e indestrutível porque vocação humana.

      Qual a sua expectativa do senhor ara este Nordestão?

     Marcos Monteiro – Gente eu já encontrei o que eu queria gente e estou encontrando novamente aqui Hundira eu encontro de pessoas eu sempre sou fascinado porque as histórias me alimentam, e alimentam a minha caminhada o encontro desses é muito pequeno, muito pequeno mesmo, porque o que você chama de pequeninos deve ser gente grande como as que encontrei pelo caminho, como Ana Maria por exemplo que você vai conversando e vai conversando e ela vai tirando do baú as histórias de vida dela que você vai se sentindo pequeno. Uma pessoa que se movimenta para ir para Nicarágua participar da reconstrução de um país com uma nova proposta. Uma pessoa que não encontra impecílio nas dificuldades, uma pessoa que luta, que batalha, nos deixa a nós, que somos intelectuais que temos uma vida mais ou menos equilibrada nos deixa em xeque, nos deixa assim... Complicam a nossa vida porque nós quando encontramos, quando entramos num encontro desse de CEB’s, com você diz, quando nós nos encontramos com a igreja dos pequenos nós não temos o direito a ostentar uma sabedoria que na verdade não nos pertence, que pertence ao mundo, pertence a todos e às vezes essa sabedoria está escondida nestas relações que nós nunca seremos responsáveis se nunca nos aproximarmos desses pequenos. Eu venho falar sobre romaria, gente, eu acho assim que o pessoal e talvez no Mistério da Graça de Deus me colocou uma chance de aprender um pouco mais sobre isso, porque um rapaz que mora em Juazeiro estava me ensinando um pouco sobre Romaria, então assim, a minha experiência com peregrinos e peregrinas do Nordeste é uma experiência menor diante da imensa peregrinação que o povo fez e faz todo dia.
 
Entrevistando Ana Maria - 6º Nordestão
Coordenadora das CEB’S - Regional Nordeste III – Bahia e Sergipe 

    Em preparação ao Nordestão que acontecerá de 19 a 22 de Julho deste ano, aqui na diocese de Itabuna, O Anúncio conversou com Ana Maria Santos dos Santos, Coordenadora das CEB’S - Regional Nordeste III – Bahia e Sergipe no triênio - novembro de 2009 a novembro de 2012. Ana Maria reside na cidade de Ibirapitanga, mas ultimamente está bem freqüente em Itabuna, principalmente na igreja Santa Rita de Cássia - paróquia anfitriã do encontro - para preparar este evento juntamente com as diversas equipes de trabalho. Nesta entrevista, a coordenadora fala sobre o Nordestão e convida toda comunidade a trabalhar pela sua realização.


O que representa um Nordestão para a Igreja Católica?

    Ana Maria: Os encontros por grande região, (no caso do Nordeste – Nordestão), desde a década de 1990, tornaram-se momentos de articulação e preparação em anos que antecedem os encontros Intereclesiais. As temáticas destes são debatidas a partir das realidades concretas de cada grande região. Neste caso, o 6º Nordestão é uma forma de fortalecer a relação e a articulação na grande Região Nordeste, subsidiando as equipes regionais de CEB’s na luta pelo fortalecimento da organização para a melhoria das condições de vida das comunidades.


E a importância de realizá-lo aqui, na diocese de Itabuna?

   Ana Maria: A realização do 6º Nordestão na Diocese de Itabuna é uma oportunidade de crescimento para a Igreja local, podendo com este evento gerir o cultivo da espiritualidade libertadora e o fortalecimento do sonho de uma sociedade mais justa e igualitária que são condições indispensáveis para seguir a caminhada


Quais são os principais desafios encontrados na preparação desse evento?

Ana Maria: No atual mundo globalizado e mercantilizado, somos induzidos a esquecer a memória, renunciar a cruz e desacreditar na utopia do Reino. Com persistência, venceremos os desafios encontrados no dia a dia, na construção deste 6º Nordestão que é desarticulação das comunidades, a crença numa
Igreja elitista e intimista. Vamos, acima de tudo, acreditar no outro e na outra.


De que forma a comunidade católica de Itabuna pode ajudar?

    Ana Maria: Se informando, se enturmado. Há lugar e trabalho para todos e todas nesta grande construção. Gente simples fazendo coisas pequenas em lugares pouco importantes conseguem mudanças extraordinárias.

2 comentários:

  1. É isso aí Ana Maria, gostei!!! "Vamos lá meu povo já chegou a hora, põe também tua mão na massa refazendo a nossa história." Um abraço fraterno!

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  2. Marcelo Barros e Pastor Marcos, obrigada por animar a nossa caminhada com palavras proféticas e cheias da ternura. Um abraço fraterno!!!

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